domingo, 9 de dezembro de 2007

Terceiro Texto - Autor: Rodrigo Capella - Presença confirmada no debate






Quem lê poesia é mais inteligente

Por Rodrigo Capella*

O leitor de poesia não é qualquer leitor. Ele é, na grande maioria das vezes, bem mais inteligente e sensitivo do que o leitor de prosa. Ler obras com começo, meio e fim é muito fácil e chega a dar tédio. O difícil e atraente é captar a essência, o dinamismo e o significado dos versos, compostos por diversas sintonias e linguagens. Tudo isso faz do leitor de poesia um leitor mais exigente e participativo.

Não é raro ele ser o primeiro a perguntar e questionar determinada questão que está sendo debatida em um evento literário. Não é raro também ele se levantar, ir na frente de todos e ler um pequeno verso que escreveu. O leitor de poesia é, portanto, um poeta, enrustido ou consciente, mas ele é um poeta. Um ser apaixonado por poesia e flexível aos movimentos contemporâneos.

Diferente do leitor de prosa, ele consegue enxergar tendências, captar informações únicas e vivenciar momentos puros. O leitor de poesia também é um grande escritor. Machado de Assis, Hilda Hilst e o criador de Sherlock Holmes, Arthur Conan Doyle, por exemplo, leram, escreveram e publicaram poesia, poesia de boa qualidade.

Machado lançou cinco livros do gênero. “Crisálidas” em 1864, seguido por Falenas (1870), Americanas (1875), Ocidentais (1880) e o excelente “Poesias Completas” (1901), que deveria ser lido por todo brasileiro poeta. Já Conan Doyle, lançou em 1898 “Songs of Action”. Depois vieram “Songs of the Road” (1911), “The Guards Came Through and Other Poems” (1919) e “The Poems of Arthur” (1922), títulos sem tradução para o português. Hilda Hilst superou os dois escritores ao apresentar aos seus leitores mais de vinte livros de poesia. Destacam-se “Do Desejo”, de 1992, e “Do Amor”, publicado sete anos depois, que apresentam uma métrica bem inovadora.

O leitor de poesia é um leitor exigente, que entra em contato com o poeta para questionar, dialogar e propor, exercendo a democracia, que está fortemente enraizada no conceito poético. Freqüentemente, passo por experiências desse tipo em eventos literários e debates sobre meu último livro, “Poesia não vende”. Leitores de várias partes do Brasil perguntam, enviam e-mails e querem saber de tudo. Percebi, nesses momentos, que o leitor de poesia é um leitor fiel as suas convicções, as suas idéias e paradigmas.

Dificilmente, muda de idéia. Na verdade, ele é um leitor fiel á própria poesia e ouvir que “poesia não vende” não é nada agradável. Mas, o poeta tem como função romper paradigmas. Então, é comum o leitor e o próprio poeta entrarem em contradição. Essa é a essência da poesia, essa é a essência da vida. O leitor de poesia é também um leitor sincero e transparente. Aplaude quando gosta de um trabalho, questiona quando se sente atordoado e lamenta quando suas expectativas não foram atingidas. É um leitor que odeia marketing, não gosta das superexposições de livros e foge das obras mais vendidas.

Ele quer novidades, quer descobrir novos poetas e quer compartilhar os seus momentos com poesias naturais, que não apresentem conceitos e idéias pré-concebidas pelo mercado editorial. Tudo isso faz do leitor de poesia um verdadeiro revolucionário, que não tem medo de sair ás ruas, ler boa poesia e promover encontros, a base de vinhos, palavras e sugestões. O leitor de poesia não teme o amanhã, sabe, aliás, que precisa ser parceiro do futuro e, que junto com ele, pode valorizar a poesia. O leitor de poesia não teme lutar contra a maré, não teme enfrentar o mercado editorial, não teme as conseqüências da valorização da poesia.

Aliás, luta por isso a todo instante, a cada dia, como se esse fosse um objetivo de vida, a principal das conquistas. Sabe que enfrenta obstáculos diários, tem consciência de que essa é uma luta sem fim e sem retorno imediato. Mas, sabe também que tudo tem um começo, tudo precisa de poesia. É graças a esses sentimentos e a esses leitores que a poesia persiste e vive, livre, leve e solta, em busca de patamares mais altos, de representatividade e, principalmente, de público, fiel ou não, adeptos ou não, poetas ou não.

O que importa é que a poesia seja lida, como se fazia antigamente nos bares, lares e escolas.


(*) Rodrigo Capella é escritor e poeta. Autor de vários livros, entre eles "Poesia não vende" e "Transroca, o navio proibido", que está sendo adaptado para o cinema pelo diretor gaúcho Ricardo Zimmer. Presença confirmada no debate. Será o mediador. Para mais informações, clique aqui

6 comentários:

Unknown disse...

Na minha opinião, quem lê já é + inteligente que a maioria, e, quem lê ou escreve poesia é um ser humano + sensível e 'antenado' que os demais.

Chellot disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Chellot disse...

Se ao ler uma poesia deixa-se fluir a sensibilidade nata do leitor, então a poesia exerce seu papel e o leitor interage com a poesia. Caso contrário, a poesia se torna apenas um conjunto de palavras sem sentido, sem movimento, algo transitório.
Esse debate deve ser super interessante.

Beijos de Sol e de Lua.

Anônimo disse...

Também estou nessa blogagem coletiva. Não sou poeta, mas arrisquei lá umas pinceladas...
Abs

Ricardo Rayol disse...

Mandou bem meu amigo, achei que tinha deixado passar por causa da tua agenda.

Unknown disse...

Comentar o quê?!Rodrigo, o teu texto descreve a alma do poeta! Como uma apreciadora de boas poesias, quero te agradecer por teres escrito esse. Sucesso na Feira! Sucesso sempre!Um abraço,